Combater
a instituição familiar é atentar contra a humanidade e a liberdade. A
família é essência do espaço privado, grupo humano em relação ao qual o
Estado só deve agir para proteger e onde não deve entrar sem expressa e
muito bem justificada determinação judicial.
É
provável que só com ler o título deste artigo alguém já me esteja
admoestando mentalmente: "Olha que Estado é laico!". Como se eu não
soubesse! Tal advertência, tantas vezes lida e ouvida, tem por
finalidade silenciar qualquer opinião que, objetiva ou subjetivamente,
mantenha relação com alguma orientação religiosa cristã. Isso leva ao
seguinte disparate: o ateu, o comunista, o materialista, o
maria-vai-com-as-outras, o iletrado e o doutor, podem falar sobre
quaisquer assunto, especialmente sobre moral e valores. Admitem-se,
inclusive, com reverências e como referências, posições das mais
diferentes culturas, da txucarramãe à budista. Calem-se, contudo, os que
pretendam dizer algo que guarde relação com a tradição judaico-cristã,
fundadora, com a filosofia grega e o direito romano, da civilização
ocidental.
O
tema "família" sempre foi conteúdo importante nas posições filosóficas e
ideológicas. Os totalitarismos investem contra a instituição familiar
dado seu notável efeito na transmissão dos valores através das gerações.
Procuram afastar os filhos dos pais, entregando-os pelo maior tempo
possível às orientações do Estado. Incentivam os jovens a delatar os
genitores por posições ou atividades contra o Estado. Engels, em "A
origem da família, da propriedade e do Estado", vai na esteira aberta
por Marx que pretendeu ter diagnosticado a família - mais do que a
propriedade - como origem da desigualdade. Fabulou ele que, no
microcosmo da família, o pai opressor desempenhava papel análogo ao do
capitalista em relação ao proletário. Ali habitava a matriz das
desigualdades a ser combatida por aqueles que consideram toda
desigualdade como um mal em si mesmo - o que, aliás, é absolutamente
falso.
Convém
lembrar, de outra parte, que não apenas os coletivismos e os
totalitarismos investem contra a instituição familiar. Também os
defensores do individualismo exarcebado, anarco-individualistas, a
atacam, embora por outra frente. Consideram que a família, por se
constituir em um "coletivo" a influenciar fortemente os indivíduos,
acaba opondo obstáculos à liberdade de cada um. Portanto, em benefício
da liberdade de todos, é preciso reduzir a força desses vínculos
internos. É preciso abri-la. E então, surpresa! Estes últimos, que
desconsideram a dimensão social da pessoa humana, acabaram sendo mais
eficazes na erosão da instituição familiar do que os próprios marxistas.
Entende-se. Os marxistas se acasalaram com um sistema econômico
inviável e o fracasso econômico acabou desacreditando seu arcabouço
filosófico. Restou apenas a mentalidade totalitária como participante do
jogo político.
A
ideologia de gênero, tão em voga, assedia o mesmo inimigo comum, ou
seja, a instituição familiar. Em nome do coletivismo e do igualitarismo,
desconhece o sexo com que se nasce para fazer, do gênero, objeto de uma
construção. Não havendo sexo, extinguir-se-ia a diferença e se
instauraria a igualdade. Para convencer as crianças disso, proclamam
indispensável à "desnaturalização dos papéis de gênero e sexualidade".
Pelo viés oposto, a ideologia de gênero, em nome do individualismo
anárquico, faz dessa "pedagogia" uma educação para a liberdade.
Não
é difícil perceber o que vai acontecer com a família à medida em que
forem prosperando os ataques ao seu sentido natural, à sua finalidade
essencial, e sendo adelgaçados, por vários modos e motivos, os vínculos
entre seus membros. Combater a instituição familiar é atentar contra a
humanidade e a liberdade. A família é essência do espaço privado, grupo
humano em relação ao qual o Estado só deve agir para proteger e onde não
deve entrar sem expressa e muito bem justificada determinação judicial.
Ela é o porto seguro, escola do amor afetivo e efetivo, do serviço
mútuo, do sacrifício pelo bem do outro, do martírio e do êxtase. Onde
mais se haverá de prover tudo isso, geração após geração?
Alguém
dirá que o parágrafo acima é ficcional. Que não se pode tomar a exceção
por regra. Admitamos. Admitamos que o descrito é exceção e que a regra,
agora, é outra. Perdeu-se, então, um tesouro.
Percival Puggina
Mídia sem máscara
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