quinta-feira, 24 de setembro de 2009

PEC para que apenas servidores de carreira sejam ministros dos tribunais de conta

O SR. FLÁVIO TORRES (PDT – CE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente Romeu Tuma, Srªs e Srs. Senadores, o controle de contas públicas constitui historicamente uma das mais relevantes e destacadas funções institucionais. Trata-se do mecanismo fundamental para garantir o princípio republicano que associa à representação política a arrecadação de recursos pelo Estado e, a partir daí, sua justa aplicação em benefício da comunidade. Por isso mesmo, há quem considere a fiscalização do poder público e de suas contas o elemento definidor do que é e do que não é tirania, conceito que se antecipou até mesmo à Revolução Francesa.
Trata-se também de uma definição política e prática. Napoleão Bonaparte constatou que, mesmo sendo imperador, em tese com o poder quase ilimitado, quando se tratava de funcionamento real das finanças do seu império tinha conhecimento apenas do que queriam que ele soubesse. Foi a partir daí que desenvolveu a idéia de criar uma instituição financeira que, em suas palavras, o informasse “sobre a gestão dos bens públicos, permitindo-lhe assim fazer um controle”. O tribunal de contas francês, diferentemente do que ocorre nas nações anglo-saxônicas e também no Brasil, sequer se subordina ao Poder Legislativo.
Sucessivas constituições brasileiras confiaram ao Tribunal de Contas da União o poder de assessorar o Congresso Nacional na fiscalização de receita e despesa do Governo Federal. Cabe a ele, antes de mais nada, o controle externo das contas, ainda que submetido ao Poder Legislativo. Essa é a formatação adotada pela atual Carta Magna, que define esse conceito de maneira ampla, como a “fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta”. Mais do que isso, a Constituição de 88 menciona não apenas o controle externo, a ser exercido pelo Congresso, mas também o controle interno, a se exercer por sistema próprio de cada Poder.
Corresponde, assim, Sr. Presidente, a uma crescente pressão que se exerce não apenas por uma correta e republicana aplicação dos recursos públicos, como também por sua transparência. Trata-se de uma reavaliação do princípio da publicidade. Contamos, hoje, com mecanismos tecnológicos e institucionais que permitem à população acompanhar mais de perto a execução orçamentária. Isso só aumenta a responsabilidade dos órgãos responsáveis pelo controle externo e interno das contas, uma vez que, de forma cada vez mais acentuada, os cidadãos tem acesso às informações relativas a ação do Estado.
Reconhecer esse fato significa reconhecer também em que medida a atuação dos Tribunais de Contas se torna fundamental para embasar a competência fiscalizatória atribuída às Casas de Poder Legislativo. As auditorias e demais procedimentos fiscalizatórios empreendidos pelas Cortes de Contas precisam cada vez mais ser marcadas por rigor técnico, até para se qualificarem, junto à opinião pública, como instrumentos privilegiados para a identificação de desvios na utilização de dinheiro público.
Infelizmente, sob esse ponto de vista, o sistema de designação dos integrantes dos Tribunais de Contas atualmente em vigor ainda apresenta deficiências. O formato adotado pela Constituição torna o processo extremamente sensível a pressões políticas, o que compromete a isenção e a independência necessárias para o correto desempenho daquelas instituições. Não me refiro aqui a qualquer das escolhas de Ministros examinadas pelo Congresso Nacional. Não faço particularizações. Acabamos, ontem mesmo, de examinar a indicação do Ministro José Múcio Monteiro Filho, figura da mais elevada qualificação técnica e política para exercer o cargo. Avaliação semelhante aplica-se, quero crer, aos demais Ministros do Tribunal de Contas da União. Nossa crítica não se refere a pessoas, mas a processos.
Em outras áreas indispensáveis à correção dos rumos estabelecidos pelo Estado adotaram-se modelos diferentes. Identificam-se como profissionalização e com a eficiência técnica. São justamente os critérios que a cidadania mais cobra do poder público. Constituem garantia de independência, como o são, desde muito tempo atrás, os predicamentos da magistratura.
Verifique-se que o Ministério Público, definido pela própria Constituição como “instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis”, adota essa profissionalização como critério básico para seu funcionamento. Determina, ainda, a Constituição que seus princípios institucionais residem na unidade, na indivisibilidade e na independência funcional. Conta assim não apenas com a autonomia funcional e administrativa, mas também com instrumentos para exercê-la, mediante a composição de quadros fundada em concurso público, em política remuneratória própria e em planos de carreira, todos determinados em lei.
É o que desejamos para a área, cada vez mais crucial e mais dependente de padrões técnicos modernos, do controle das contas públicas. Nesse sentido, estamos apresentando uma Proposta de Emenda à Constituição com a qual pretendemos adequar aos tempos atuais o sistema de controle. De acordo com essa proposta, faz-se com que os integrantes das Cortes de Contas sejam selecionados dentre os servidores dos próprios Tribunais – profissionais cuja qualificação é demonstrada pela aprovação em concursos públicos – que contem com, pelo menos, dez anos de experiência profissional.
O que se faz, portanto, é criar um sistema autêntico e independente de controle de contas, ainda que mantendo o vínculo básico com o Poder Legislativo. Estabelece-se nova carreira integrada, partindo da base do sistema e chegando até o seu topo, que é a elevada função de Ministro do Tribunal de Contas.
A proposta altera a redação dos §§ 1º e 2º do art. 73 da Constituição, promovendo as mudanças mencionadas para o Tribunal de Contas da União. O art. 75 da Constituição Federal também é modificado, para deixar claro que o procedimento empregado para nomeação dos integrantes do Tribunal de Contas da União deve ser aplicado ainda nas instituições homólogas dos Estados, Distrito Federal e Municípios.
Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, não ignoro que, por significativa mudança do statu quo, a proposta que agora apresento, com o respaldo de 32 outros Senadores, enfrentará dificuldades para sua aprovação. Mesmo assim, acredito que merecerá de meus pares, assim como da Câmara dos Deputados, um exame atento e, por fim, o voto favorável. Estaremos não apenas modernizando o aparato estatal, mas também satisfazendo os justos anseios da opinião pública. Mais do que tudo, estou certo de que apresentamos uma contribuição ao aperfeiçoamento do controle externo no País.
Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

Nenhum comentário:

Postar um comentário