sábado, 30 de julho de 2011

Toffoli na ilha de Capri: dúvidas que persistem

Eram previsíveis as reações à notícia de que o ministro José Antônio Dias Toffoli, do STF, faltou a um julgamento para ir ao casamento do advogado Roberto Podval na ilha de Capri, na Itália, sem esclarecer quem pagou as despesas, segundo a Folha revelou na última sexta-feira.
O site “Migalhas”, patrocinado por escritórios de advocacia, considerou a reportagem leviana, fruto da estiagem de notícias no recesso do Judiciário.
“Falando com o conhecimento de causa de quem esteve presente”, afirmou o editor do site, “os noivos ofereceram a todos os convidados, indistintamente, duas diárias no hotel onde se realizou a cerimônia, fato que parece lógico porque, não fosse assim, praticamente não seria possível ir ao casamento, uma vez que a referida ilha tem seus alberghi lotados meses antes do verão chegar ao Velho Continente”.
“Mesmo que a meritíssima presença fosse por conta do afamado criminalista, é normal que magistrados tenham relação de amizade com advogados, com promotores, com defensores, com procuradores e com todos aqueles que labutam no meio jurídico”, opinou o editor do “Migalhas”.
Sob o título “Juízes repelem suspeição invocada por jornal”, o site “Consultor Jurídico” informou que processualistas, criminalistas e dirigentes de entidades de classe rechaçaram a tese do jornal de que a presença de Toffoli na festa teria provocado situação de impedimento judicial.
“As hipóteses de suspeição previstas em lei referem-se apenas à relação de amizade íntima ou inimizade capital entre o magistrado e a parte [autor ou réu da ação], jamais em relação ao advogado”, esclareceu o presidente da Associação dos Juízes Federais (Ajufe), Gabriel Wedy.
O presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros, Nelson Calandra, não viu interesse público na notícia, segundo o “Conjur”. Para Calandra, a “notícia só serviu para lançar suspeita sobre episódio em que nada há de errado”.
Para o criminalista Arnaldo Malheiros Filho, também ouvido pelo “Conjur”, a visão de que o juiz deve ser um recluso é irreal e ingênua. O presidente da Associação Paulista dos Magistrados (Apamagis), Paulo Dimas De Bellis Mascaretti, afirmou ao site que “a Justiça não seria melhor se os juízes fossem encastelados e isolados como jurados em véspera de julgamento”.
Wedy e Calandra também foram ouvidos, no dia seguinte, pela Folha.
Em editorial, o jornal sustentou que o episódio é “uma ilustração constrangedora da promiscuidade entre interesses públicos e privados que dá o tom da vida republicana no Brasil”.
O Blog entende que a questão é, sim, de interesse público. Desde que paguem integralmente as suas despesas, magistrados podem ir a casamentos de amigos na ilha de Capri, na ilha de Comandatuba ou nas ilhas Aleutas.
Magistrados não vivem enclausurados, mas os mais cuidadosos, em respeito à instituição e ao interesse público, só recebem advogados com as portas abertas ou na presença de assessores, o que foi admitido por vários juízes numa das primeiras enquetes publicadas por este Blog.
Não surpreende também a reação de advogados quando ministros do STF são questionados sobre os limites entre o público e o privado. Lá atrás, quando o Ministério Público Federal levantou suspeitas sobre negócios entre órgãos públicos e o instituto privado de ensino do qual Gilmar Mendes é sócio, advogados renomados revezaram-se para defender o ministro.
A própria Ajufe, na gestão anterior, não viu impropriedade em pedir dinheiro à Caixa Econômica Federal, um banco oficial, para bancar parte das despesas no jantar que a associação --uma entidade privada-- organizou em homenagem à Toffoli por sua posse no Supremo.
Aparentemente, há pontos importantes ainda não esclarecidos pelo ministro sobre a viagem a Capri.
No dia 28 de junho, o jornalista Lauro Jardim, da “Veja”, informou, em sua coluna: “Toffoli aproveita a viagem particular à Europa para se reunir com autoridades do governo alemão envolvidos em uma recente reforma eleitoral no país. Toffoli, que é presidente da Comissão de Reforma Eleitoral do Senado, apresentará em agosto um texto com sugestões de mudança dos sistemas político e eleitoral brasileiro”.
A informação admite as seguintes dúvidas: Qual o motivo alegado pelo ministro ao STF para faltar à sessão de julgamento? Ao comparecer ao casamento do amigo, estava em viagem particular ou esticando eventual missão oficial?
Segundo o jornal “O Estado de S. Paulo”, “o ministro estava na ocasião ‘ausente justificadamente’". "A assessoria de Toffoli disse que ele comunicou a ausência num ofício encaminhado ao presidente do Supremo, Cezar Peluso”. A assessoria também confirmou ao jornal paulista que o ministro “saiu antecipadamente de férias e prestigiou o enlace ocorrido em 21 de junho‘.
Finalmente, ainda no mesmo jornal: “Toffoli informou por meio de sua assessoria que pagou pelos deslocamentos aéreos. Mas não disse se arcou com as despesas hoteleiras”.
É do interesse público que essas questões sejam esclarecidas. E deveria ser do interesse do ministro que as dúvidas fossem eliminadas por ele mesmo, para não permitir que outros, por bajulação ou para ficar bem na foto, se antecipem ao que deveria ser sua obrigação.

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